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PORTO VELHO: NATUREZA EM CHAMAS
19 de  agosto de 2024 |
Autor : Acler | Fonte : Acler
Sandra Castiel
Era madrugada de quinta-feira quando despertei; minha respiração estava difícil, as vias respiratórias pareciam ter dificuldade em cumprir sua função. Levantei da cama, meio zonza, precisava de um copo d’água. Abri a porta do quarto e achei que minha casa estivesse em chamas: uma nuvem de fumaça preenchia cada espaço do corredor, inclusive do meu próprio quarto. Corri até a sala e a cozinha, a maldita fumaça mal permitia que eu enxergasse os móveis e os eletrodomésticos. Atônita, achei que a fumaça poderia vir das casas vizinhas, não vinha. Fui até o jardim, morada de dezenas de passarinhos que me alegram a vida com seu canto, mas não consegui vislumbrar as árvores e as plantas. Pensei nos diversos ninhos e nos filhotes ali abrigados: meu Deus, como iriam respirar normalmente? São seres tão frágeis...
Custei a entender que aquela cena terrível era o rastro da Morte, era a natureza em chamas, centenas ou milhares de árvores sendo derrubadas pela crueldade de quem queima vidas, para custear sei lá o quê; nada justifica o assassinato de tantos seres vivos que são gerados no ventre da floresta, a nossa floresta, a floresta que nos viu nascer e crescer nas terras de Rondônia, numa época em que se adentrava a floresta apenas pra colher o que ela produzia para a sobrevivência humana.
A floresta mantinha em seu entorno uma mulhara de energia invisível para nossos olhos, energia que fluía dos seres encantados que lá viviam para protegê-la: respeitávamos as lendas e os mistérios que constituíam nossa riqueza cultural.
Afinal, de que adiantou o “desenvolvimento” deste estado? O estado “cresceu” a troco de derrubadas inimagináveis; agroculturas de outras regiões testadas em nosso solo e incompatíveis com o clima e com a própria terra: “não tem problema, vamos experimentar em outro lugar”. E assim nossa grande, amada e cultuada floresta, gigante verde que abriga o coração da Amazônia, foi maculada com milhares de quilômetros de derrubadas e queimadas, locais onde a natureza não gera mais vidas. As questões de sobrevivência dos agricultores que deixaram sua terra de origem movidos pelos apelos de um ex- governador militar são legítimas e envolvem outras reflexões.
Deixo aqui minha indignação com o injustificável assassinato de nossas matas: a quem recorrer? Ouve-se tanto sobre projetos de órgãos responsáveis pelo meio-ambiente... Onde estão essas pessoas? A que vão atribuir crime de tal intensidade? Combustão de proporções absurdas, fumaça com cheiro de madeira nobre queimando? Não sei não.
Que os seres encantados que vivem nos recônditos da mata, dos rios, dos igarapés, dos igapós, clamem pela chuva, pois é ela quem reorganiza os incontáveis ecossistemas ali existentes e a sobrevivência de nossa floresta; que os crimes ambientais não fiquem impunes; que sobre os algozes da natureza pese a mão do Criador.
ACLER - Academia de Letras de Rondônia
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